15/02/2015

Texto | O mistério dos três irmãos - Capítulo dois

Isack
            A noite estava fria e clara. Isack sempre gostara da lua cheia. Ele a fitava por horas antes de dormir. Margaret sempre dizia que a lua cheia era ruim, que coisas sombrias costumavam a aparecer naquele período lunar e que não era prudente deixar de rezar ou cercar a casa com água benta. Isack, mesmo em seus quatorze anos de idade, conseguia entender que certas histórias que Margaret contava não faziam nenhum sentido, porém ele gostava de ouvi-las e usar a sua imaginação.
            – É nisso o que dá não querer comer direito. Falava Margaret sentada em uma velha cadeira de balanço enquanto tricotava algum tipo de toca com lã azul. – Agora fica ai, jogado as traças olhando incansavelmente para a lua.
            O quarto de Isack não era tão grande quanto o de Fábian, mas era composto por um grande espaço de chão liso de madeira e uma cama de casal bem no meio do cômodo. Não se via muitos móveis, apenas uma mesinha de escrivaninha que ele usava para ser educado em casa. Muitas vezes pela sua governanta Margaret. Havia também um grande guarda-roupa de madeira grossa e envernizada. Mas somente isso para um quarto daquele tamanho, o deixava quase que triste. Porém uma enorme janela com vidros em forma de quadrados transparentes lhe dava uma visão perfeita da lua cheia. Havia um pequeno tapete no chão onde ele podia se sentar e apreciar toda aquela imensidão amarelada enquanto seus raios iluminavam tudo a sua volta.
            – Eu a adoro, Margaret.
            A velha senhora balançou-se mais um pouco em sua cadeira e checou alguns pontos do seu tricô. Aquele rosto mostrava bastante idade, porém Isack sabia que também mostrava experiência. Ele havia aprendido muitas coisas com Margaret. Inclusive a ama-la como uma segunda mãe, uma vez que a sua morrera lhe dando a luz. Foi Margaret quem cuidou dele desde recém-nascido. Ela o alimentou, o educou, o ensinou, o castigou. E mesmo que nesse momento ela o estivesse punindo novamente, no fundo ele sabia que tudo era para o seu próprio bem.
            – Eu já lhe falei sobre como ela foi parar lá no céu? Perguntou a governanta sobre os oculozinhos que ela usava para enxergar os pontos mais finos. – Já lhe disse a história dos dois irmãos que brigaram e Deus os condenou a um iluminar somente de dia e o outro iluminar somente à noite?
            Na verdade, Isack já tinha ouvido algo parecido, mas resolveu dizer que não somente para poder entrar de cabeça no que Margaret contaria.
            – Era uma vez, dois irmãos. Começou Margaret. – Assim como você e os seus irmãos. Eles eram fortes e vigorosos. Eles foram um dos primeiros homens a habitarem nessa terra. Oh sim. Ela balançava a cabeça para o menino. – Mas tinham um defeito. Brigavam muito entre si, não obedeciam às ordens de seus pais nem de sua governanta. Margaret procurou ressaltar. – Até que um dia, vendo toda essa desobediência, Deus os amaldiçoou e condenou que um governasse o dia e o outro governasse a noite.
            – Mas não é isso que eu aprendi com o padre Harris. Questionou o menino.
            – Ora, o padre Harris não tem permissão para contar isso a você. Rebateu a senhora idosa. – Mas sabe qual foi o pior dos castigos recebidos pelos dois irmãos? Ela levantou uma de suas sobrancelhas pintadas com lápis de olho. – Foi o de governar a noite. Afirmou Margaret com um olhar sério e minucioso para Isack.
            – Por quê? Isack levantou-se e foi se sentar aos pés da cadeira de balanço. O grande vestido de Margaret esbarrava no chão aos movimentos de balanço.
            – Por causa dos demônios da noite, meu jovem. Sussurrou a senhora. – Por causa das criaturas que vagam pela sombra sempre a espreita de alguém em que possam tragar. Por causa das bruxarias que a lua é obrigada a assistir quando os bebês são roubados de suas mães no meio da noite e sacrificados a Deuses pagãos. Por causa da maldade dos homens perversos que se transformaram em lobisomens para que sejam lembrados eternamente da sua vergonha.
            A imaginação de Isack voava para longe naquele momento. Em sua cabeça ele entrava nos bosques no meio da noite com a espingarda de seu pai, pronto para caçar qualquer criatura que o tentasse atacar.
            – Por isso a lua cheia traz maus presságios meu jovem. É exatamente quando essas coisas se fortalecem e vem nos atacar.
            Houve uma batida na porta e o Sr. Jones entrou no quarto do seu filho mais novo. Suas botas ainda estavam um pouco sujas de lama da floresta.
            – Contando histórias de terror ao garoto outra vez, Margaret? O Sr. Jones sorriu para o filho em meio à bigodeira e o chapéu de vaqueiro. – Não é nada sobre lobisomens outra vez, é?
            Isack correu para abraçar o pai enquanto dizia facialmente para que não repreendesse a governanta, afinal ele adorava ouvir suas histórias. Ele abraçou o pai e deixou com que ele desarrumasse os seus cabelos.
            – Margaret, eu quero que oriente as criadas em como preparar o javali que pegamos hoje à noite. Por favor, não as deixem fatia-lo como da ultima vez. Quero ver o meu prêmio inteiramente assado hoje.
            Margaret colocou o seu tricô no cesto e o empurrou para o canto do quarto de Isack. Seu longo vestido balançou um pouco quando ela se aproximou e fez uma reverência ao Sr. Jones.
            – Se vista Isack, hoje o jantar será soberbo. Disse o Sr. Jones ao filho.
            O Sr. Jones saiu do quarto e Isack deu uma breve olhada em sua arma que balançava sobre o molde feito especialmente para ela.
            Isack foi até seu guarda-roupa e escolheu uma roupa adequada para ocasião. Margaret sempre dizia: “Nem muito elegante, nem muito desleixado” Então ele pegou um colete juntamente com uma calça preta enquanto dava mais uma olhada na lua cheia.

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